Agora eu não preciso me envergonhar toda vez que falar sobre o Porão do Rock porque perdi a virgindade ontem, no primeiro dia da 16ª edição do evento, que este ano acontece no estacionamento do Mané Garrincha. Nunca fui por falta de tempo, de oportunidade, de entusiasmo mesmo.
Bom, já digo logo de cara que a experiência não foi das melhores. Mas também não foi das piores. Diria que foi no mínimo acidental e, em alguns casos, recheadas de agradáveis e momentâneas surpresas. E tudo por conta do que o meu amigo Pedrão classificou, oportunamente, de “criaturas peterpanescas”. Sim, aqueles adolescentes jovens de verdade que, junto com aqueles adolescentes velhos de mentiras – enfim, os vovôs com síndrome de James Dean que -, uma vez na vida colocam suas camisetas de roqueiros ocasionais fedendo à naftalina como se fossem uniformes juvenis para tirar onde de rebelde sem causa. Nem que seja por uma noite ou como diria o Renato Russo naquela canção: “Só por hoje”. Puro e simplesmente comportamento condicionado, digno de estudo acadêmico.
E ontem o que mais tinha no Porão do Rock eram essas figuras caricatas e foi justamente de uma delas que ganhei uma “voadeira telequete” que fui parar longe. A pancada foi tão forte que pensei que tinha quebrado uma costela e saltei alto como num desenho animado.
O debilóide autista, no auge de sua euforia “peterpanesca”, provavelmente com o rabo cheio de cachaça, estava brincando com os amigos da “dança da porrada” – aquela em que uma turma acéfala dança saltando socando e empurrando uns aos outros – e nem se deu conta do que aconteceu. Quando a fixa caiu para ele, o boboca teve coragem de pedir desculpas e eu só não dei um caratê nele porque não estava com o rabo cheio de cachaça também. Do contrário teria apanhado até morrer.
Resumo do rock: fiquei com os nervos tão abalados com o episódio que depois topava com todo mundo que entrava na minha frente. Definitivamente estou velho para essas coisas. O estresse foi grande que nem reparei direito nas “metal babies” que passavam aqui e acolá, quase todas com alfinetes na orelha, no nariz e nos olhos, uma visão do inferno.
Quando o susto passou, relembrei dos meus tempos de Bizz ouvindo o som furioso dos capixabas do Dead Fish, o cover honesto dos argentinos metaleiros do Banda de la Morte tocando I wanna be your dog (Stooges), a nostalgia oitentista dos paulistas do Nem Liminha ouviu, a gostosinha vocalista do Leela, enfim, da irreverência do vocalista do Matanza com sua persona Viking.
Mas, como grande parte da garotada nova e velha que estava lá, eu aguardava, não tão ansioso assim, pela principal atração da noite, os meninos do Capital Inicial que, gostem ou não, foram profissionais em cima do palco e agitou o público com canções novas, hinos clássicos de bandas ícones da cidade como Raimundos e Legião Urbana, além de um cover competente do Dinho de White Stripes.
“Galera, pau no cú para esses políticos do Brasil”, disse o inquieto e carismático vocalista do Capital Inicial, dando os dois dedos para cima, nariz de palhaço na cara.
Com certeza não foi o melhor show do Capital Inicial que já fui, mas tudo bem, de graça até injeção na testa. Na próxima edição do Porão do Rock vou tirar minha fantasia do Peter Pan ou do Capitão Gancho do armário. Ou melhor. Na próxima edição do PDR vou de fadinha Sininho. Com piercing no nariz e tudo.
* Este texto foi escrito ao som de: The Stooges (1969)