Exposição Titanic é para elite brasiliense

Titanic o filme é uma droga, a exposição no Park Shopping cara para dedel…

Não sei se você já viu, mas tem uma tenda enorme no estacionamento do Park Shopping e não é o Cirque du Soleil. Na verdade, não é circo nenhum. É da Exposição Titanic, com relíquias e restos do navio mais famoso do mundo resgatados do fundo do mar. Aquele que naufragou no início do século passado e foi imortalizado no cinema por James Cameron.

Bem, vi o filme e odiei. E, se não fosse outros trabalhos de Leonardo DiCaprio, também teria odiado o bonitão de olhos azuis até hoje. Já James Cameron não tem jeito, não. Ódio profundo até o final dos tempos. Leonardo para mim só o Da Vinci, que, aliás, teve uma exposição muito bacana no Brasil e de graça. Mas comparar Leonardo Da Vinci com o Titanic é a mesma coisa que comparar Os Beatles com a Lady Gaga. Ou seja, um sacrilégio hediondo.

Mesmo assim, botei minha melhor gravata e lá fui eu com essa cara-de-pau que Deus me deu para ver a exposição. Acontece que, para se deslumbrar com o que sobrou do maior navio para passageiro já construído até hoje na face da Terra é preciso desembolsar R$ 40 pilas. Mas se você tiver uma carteirinha falsificada de estudante pode pagar só a metade.

Como não tenho carteirinha e nenhum dinheiro no bolso, fiquei, literalmente, a ver navios. Sim, porque não pago R$ 40 mangos para ver essa exposição nem aqui, nem na China. Muito menos ali no estacionamento do Park Shopping. Onde já se viu uma coisa dessas.

A história conta que só viajou no Titanic que afundou em 1912, quem era da alta sociedade europeia ou os riquinhos da esnobe sociedade norte-americana. A elite meu caro, os burgueses ululantes. E a história na mudou muito não porque só vai ver essa exposição no Park Shopping a esnobe elite brasiliense, aqueles riquinhos babacas e arrogantes que gostam de arrotar cultura e civilidade intelectual só paraexibir suas fortunas ilícitas.

Mas um motivo para odiar o filme que é um melodrama ridículo. Ou seja, já não gostava da faraônica produção hollywoodiana do James Cameron e odeio a exposição que nem vi. Mas sabe o que me deixa mais fulo da vida, babando na gravata. É saber que Titanic de James Cameron tem o mesmo número de Oscars do que Ben-Hur, um dos melhores épicos já realizados até hoje. Ao todo, são 22 estatuetas, 11 estatuetas para cada lado.

Toda vez que me lembro disso, tenho vontade de naufragar como esse colosso do mar. Junto com os R$ 40 que não gastaria para ver a exposição.

Assim nasceram os épicos bíblicos

A Paixão de Cristo: A mais fantástica de todas as histórias

Nos anos 40 os irmãos Harry e Jack Cohn estavam à frente do poderoso estúdio Columbia. Eles se odiavam e um dia tiveram uma briga estrondosa por causa de religião.

– Não meta o nariz na parte dos negócios, retrucou raivoso Harry diante da proposta do irmão Jack de fazer um filme bíblico.

– Só pensei que podíamos fazer um filme bíblico, Harry, só isso, continuou Jack. – Tem um monte de histórias boas na Bíblia, argumentou.

– Que diabos entende você da Bíblia?, desafiou o irmão. – Aposto que você não sabe nem o Pai-Nosso!

– Claro que sei, desafiou Jack.

– Sabe o cacete! – ironizou Harry. – Aposto cinqüenta dólares que você não reza o Pai-Nosso. Vamos lá, aposte o dinheiro ou cale a boca.

Assim, cem dólares foram colocados sobre uma mesa.

– Tudo bem, reze, disse Harry aos faniquitos.

– Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador…, começou Jack, com orgulho soberbo.

– Pare, pare, irritou-se Harry, entregando o dinheiro ao irmão com relutância, arrematando zangado. – Achei que você não soubesse.

Bem, a história é de um surrealismo ululante, mas a segunda onda de filmes religiosos que invadiram Hollywood em meados da década de 40 e 50 começou assim, de um mal-entendido escandaloso entre dois ignorantes no assunto.

Mas, que segunda onda era essa afinal? Bem, nos anos 20 e 30 o poderoso diretor e produtor Cecil B. De Mille, já uma legenda naqueles auspiciosos anos, havia implementado a primeira incursão no gênero ao arregaçar as mangas e colocar Moisés para atravessar o Mar Vermelho e Jesus dependurado numa cruz em grandes produções de sucessos como Life of Moses e The king of Kings.

O poderoso diretor e produtor Cecil B. DeMille acreditava ser o escolhido de Deus para adaptar a Bíblia para o cinema

Nos anos 40, mais poderoso do que nunca – a ponto de o dramaturgo Nelson Rodrigues sempre mencioná-lo em tom de piada em suas crônicas quando queria enfatizar algo grandioso – De Mille novamente encabeçaria a segunda onda de épicos bíblicos com a realização, em 1949, da clássica história de amor e traição vivida por Sansão e Dalila. E porque, não? Afinal, eles tinham na figura de Cristo um garoto-propaganda formidável e como símbolo simples, mas eficiente, a cruz.

Daí para frente o que se veria era um enxame de inspirações caça-níqueis que se materializaram em superproduções épicas com temáticas religiosas tque marcariam toda uma geração como Quo vadis (1951), O manto sagrado (1953), Os dez mandamentos (1956), Ben-Hur (1959), Barrabás (1961), O rei dos reis (1961), Cleópatra (1962), A queda do império romano (1964), A Bíblia… No início (1965) e tantas outras.

O que poucos sabiam é que, por trás de conflituosos duelos financeiros e, hediondas brigas por bilheterias, muitos desses filmes traziam em seus enredos veladas críticas e observações sobre as doenças e vilanias do mundo moderno como a ganância dos homens no poder perpetrada na figura do faraó Ramisés em Os dez mandamentos, o homossexualismo em Ben-Hur, o medo e as conseqüências da ascensão do nazismo em Quo Vadis.

O curioso ainda é que os mais tocantes filmes sobre o tema não tiveram Jesus Cristo, a figura central da fé cristã, como protagonista principal. Aliás, algumas delas nem aconteceram de fato, como a trajetória após a libertação na Páscoa do ladrão e assassino Barrabás, romanceada por Pär Lagerkvist, ou a trágica saga do judeu nobre Judah Ben-Hur, roterizada por Karl Tunberg, a partir de um argumento, olha vejam só, do escritor norte-americano Gorel Vidal.

Bem, ao usar como esteio uma das maiores história de todos os tempos, a Paixão de Cristo, muitos desses filmes faz com que seus personagens, de uma maneira ou de outra, cruzem com os caminhos do Salvador, construindo verdadeiros ensaios sobre a moral, a fé, a culpa, o perdão e, sobretudo, o amor ao próximo.

A seguir, um top five pessoal com curiosidades e comentários dos melhores filmes bíblicos que me marcaram

Sansão e Dalila (1949) – É a maior história de amor e traição que a humanidade já conheceu e que o cinema já contou. Tirada do Velho Testamento, narra história de um judeu dotado de força descomunal que tem seus sentimentos negligenciados pelos interesses escusos da diabólica rainha dos filisteus Dalila, interpretada pela deliciosa Hedy Lamarr.

Realizado com recursos tecnológicos medíocres para época, um detalhe que hoje faz a alegria de gente como Steven Spielberg, o filme, dirigido pelo próprio Cecil B. DeMille tem momentos mágicos, como a furiosa sequência em que Sansão, armado de uma queixada de burro, mata uma legião de soldados ou a cena final em que, cego e com as madeixas recuperadas, ele põe abaixo um templo inteiro. Gosto daquele em que ele mata um leão com as próprias mãos.

Quando o filme estreou, o comediante Groucho Marx foi ver o filme e quando viu o ator Victor Mature na pele do herói bíblico tomou um susto, mas não perdeu a piada. “Não assisto a filmes em que o busto do ator seja maior do que o da atriz”, disse.

Peter Ustinov soberbo como o imperador Nero em Quo Vadis, botando fogo nos cristãos e em toda Roma

Quo Vadis (1951) – Baseado na novela do escritor Henryk Sienkiewicz, o roteiro dessa primeira grande superprodução religiosa não tinha como fonte a Bíblia, mas se encaixou com perfeição ao gênero, tanto que é um dos maiores sucessos da safra. Na história, o bonitão Robert Taylor vive um arrogante comandante romano pagão que reluta em não aceitar Jesus e a fé cristã em seu coração. O amor da bela jovem Lígia (Deborah Kerr) é a única coisa que ele quer que preencha seu peito.

Mas Roma é governada pelo insano imperador Nero, matricida que é uma caricatura afetada de Hitler. Sua sede de poder é inesgotável, os limites da loucura também não têm fim até o dia em que ele coloca fogo em Roma, dado início a derrocada de um dos maiores impérios que o mundo já conheceu.

Produção imponente que chegou a ter John Houston como diretor e o galã Gregory Peck na pele do aristocrata romano, Quo Vadis, rodado no mítico estúdio Cinecittá, em Roma, contou com 60 mil figurantes, mais de 50 leões conseguidos nos circos europeus e admiração do papa Pio XII. Na trama, as sinuosas armadilhas urdidas pelos caminhos passionais da ideologia, aqui travada no embate ferrenho entre a fé cristã e a força eloquente romana.

Dirigido por Marvyn Leroy, homem de confiança do produtor Louis B. Mayer chamado às pressas para tocar adiante o projeto, o filme tem nas atuações o ponto alto. Destaque para os coadjuvantes, entre eles o excelente Peter Ustinov, como o nefasto Nero e Leo Genn aqui soberbo como o diplomata e governador Caius Petronius, o homem que radiografou a vida mundana dos submundos de Roma na clássica obra Satíricon, imortalizada por Fellini nas telonas.

Preste atenção nas magníficas cenas que reproduzem o circo de Roma, cujo ápice está na batalhar mortal entre um touro irascível e o gigante judeu Ursus.

Richard Burton no clássico do gênero que foi o primeiro filme em cinemascope da história do cinema

O manto sagrado (1953) – Esse épico tonitruante passado na época de Cristo foi o primeiro filme rodado em cinemascope da história do cinema. Baseada na obra de Lloyd C. Douglas, narra trajetória do centurião Marcellus Gallio, o ator Richard Burton num de seus primeiros papéis expressivo. Ele é o soldado encarregado de supervisionar a crucificação de Cristo, mas ao ganhar o manto que cobria o filho de Deus num jogo de azar, no pé da cruz, tem sua vida transformada para sempre.

Também estrelados por Jean Simmons e Victor Mature, esse clássico do gênero renderia uma continuação no ano seguinte, com o gradalhão Victor Mature como um dos heróis da arena de Roma em Demetrius e os gladiadores.

A cena de maior impacto está logo nos primeiros minutos, quando manto de Cristo, como num passe de feitiçaria, enforca um dos soldados de Roma, quase o matando.

Os dez mandamentos (1956) – Segundo o escritor, crítico de cinema e jornalista Ruy Castro, Cecil B. DeMille acreditava ser o escolhido de Deus para adaptar a Bíblia inteira para as telas. E só não fez isso por falta de tempo. Responsável por inaugurar o gênero ainda na década de 20, o mítico diretor e produtor, que já havia contado a vida de Moisés no cinema, volta às origens nessa mega, hiper, superprodução de 1956.

O filme traz a assinatura do grande mestre e um elenco fabuloso encabeçado por Charlton Heston, que aqui segue os passos de sofrimento e cativeiro do patriarca hebreu. Fazem parte do cast ainda astros como Anne Baxter, Edward G. Robinson, Vincent Price e Yul Brynner, magistral na reencarnação do faraó Ramsés.

Figura respeitada na corte egípcia, na condição de príncipe, Moisés renega uma vida de privilégios e ostentações para salvar o seu povo da escravidão. Perseguido pelo faraó Ramsés, vive décadas no exílio até ser o escolhido de Deus para conduzir os hebreus à liberdade. Mas não será fácil, enfrentando obstáculos como a travessia do Mar Vermelho e a descoberta, no Monte Sinai, das tábuas sagradas que trazem os Dez Mandamentos.

Norteado pelo tema da inveja e da esperança, o filme teve o roteiro baseado nas escrituras sagradas e cenas rodadas no próprio país dos faraós onde uma população inteira de figurantes fora usada, cerca de 60 mil pessoas. E não só isso, cenários suntuosos foram erguidos da noite para o dia e uma legião de técnicos desembarcou na região do Nilo para DeMille pudesse realizar seu sonho megalomaníaco.

Num dos documentários sobre o filme, o astro Charlton Heston lembraria a grandiosidade do set num episódio divertido em que um dos câmeras não consegue ouvir as instruções do diretor, depois outros dois fracassam na tentativa de filmar a famosa cena do êxodo.

Charlton Heston (esq.) na furiosa e inesquecível corrida de bigas no maior e melhor de todos os épicos

Ben-Hur (1959) – Talvez o mais emblemático dos épicos já realizados, essa produção dirigida pelo mestre Willian Wyler foi ganhadora de 11 Oscars, incluindo o de melhor filme, diretor e ator para Charlton Heston. Um feito notório que só seria quebrado quase 40 anos depois com a bobagem sentimentalóide Titanic. O roteiro do filme, escrito por Karl Tunberg, em cima do argumento do então jovem e promissor escritor Gore Vidal, é uma jóia rara.

Importante membro de família nobre da Palestina, Judah Ben-Hur reencontra o amigo de infância Messala (Stephen Boyd), agora um arrogante comandante da guarda romana. Mudado e enfeitiçado pelo poder, ele tenta usar o companheiro do passado para tirar proveito em favor dos interesses de Roma na luta contra a ascensão do cristianismo.

O intento fracassa e como represália ele joga a mãe e a irmã do amigo judeu no calabouço, condenando-o a passar o resto de sua vida nas galés romanas. Mas um acidente em meio terrível batalha naval lhe dá a chance da liberdade e a esperança de vingar seu passado.

Pavorosa fábula sobre a vingança, a trama gira em torno de conceitos morais perturbadores como a culpa, o perdão, o medo da solidão e o rancor. “Você guarda muito ódio em seus olhos. Isso é bom, o ajuda a manter-se vivo”, ensina o general da galé que ele ajuda salvar. Mas o que poucos sabem é que o filme traz velada passagens que fazem alusão ao homossexualismo. Preste atenção nos personagens masculinos no filme.

Rodado no longínquo ano de 1959, o filme conta com uma das cenas mais fabulosas e inesquecíveis do cinema, na famosa sequência da corrida de bigas. Os cenários e sets são deslumbrantes e a direção de arte impecável, uma perfeição. Mas o melhor momento do filme é o mais intimista e teatral de todos. É quando Ben-Hur, quase desfalecido de sede, é ajudado pela figura mítica e imponente de Cristo, que perturba e emociona o espectador sem mostrar o rosto ou dizer uma palavra. Bom cinema é assim.

“Livre, quem, eu?!”, Anthony Quinn em dúvida no papel do personagem-título 

Barrabás (1961) – Não sei vocês, mas eu sempre tive curiosidade de saber o que tinha acontecido com o ladrão e assassino, Barrabás, depois de ser libertado, na Páscoa, em troca de Cristo. Mistério solucionado pelo escritor Pär Lagerkvist em sua novela que deu origem ao roteiro do clássico filme de 1961 estrelado por Anthony Quinn.

Nem precisa dizer que a atuação de Quinn está soberba, mas o grande mérito está no ótimo roteiro que explora os dramas da culpa e da consciência pesada do personagem que não consegue entender porque foi escolhido para viver no lugar do Salvador.

Atormentado por esse fantasma dia e noite e renegando a doutrina cristã, ele irá viver incríveis aventuras e tragédias pessoais que o tornará um dos mais destacados heróis do circo de Roma como gladiador, local onde todas as tramas do gênero parecem terminar. O desfecho é surpreendente e exemplar.

O oscar é uma festa de lobistas

Ter uma estatueta dessa pode dizer muita coisa, mas também não quer dizer nada

Hoje tem entrega mais uma cerimônia do Oscar. É a 83ª edição. Já perdi as contas de quantas vezes assisti ao evento. Também não sei quantas vezes cobri a festa pela televisão para o jornal. O que posso dizer é que não estou nenhum um pouco empolgado com essa baboseira toda que se tornou a entrega da estatueta mais cobiçada do planeta.

Na verdade, já faz um bom tempo que não dou a mínima, nenhuma pelota mesmo para quem venceu o que e em qual categoria. Me interessa ver o filme pelo mérito próprio que ele tenha em todas as suas feituras, arranjos, independente de quantas indicações ele tem. Já foi o tempo que eu ficava que nem torcedor bobo na arquibancada esperando ver quem seria o grande vencedor da noite.

Vi que o Oscar é uma grande bobagem, farsa, embuste, quando em 1997 o dramalhão Titanic arrebatou 12 estatuetas, igualando-se ao número de Oscars da obra-prima épica Ben-Hur. Imagina, aquela coisa ridícula com o Leonardo DiCaprio gritando “Eu sou o rei do mundo!” na proa de uma navio fantasma levar 12 prêmios?! Foi a gota d’água.

De modo que estou por fora este ano. Não sei de nada de indicações, quem concorre a quê e em quantas categorias. Vale dizer que vi poucos filmes que estão concorrendo. Dos poucos que vi nem achei grande coisa assim, embora sejam obras acima da média da grande enxurrada de lixo que os produtores vem jogando nas salas de cinema.

O que sei é que este ano o número de filmes indicados na principal categoria, Melhor Filme, aumentou. São dez. Antes eram cinco. Desses, só vi cinco. Bravura indômita, Cisne negro, O discurso do rei, Toy Story 3 e A origem.

A indicação de Toy story 3 como melhor filme é uma aposta no segmento que mais tem crescido no cinema: a animação

Gosto mundo do Christopher Nolan, o diretor inglês que dirigiu pérolas como Memento, insônia e revitalizou a saga do cavaleiro das trevas em Batman begins, um dos meus heróis prediletos. Ele tem um dom incrível para trabalhar no cinema com elementos abstratos como o inconsciente, os sonhos, delírios e devaneios da mente, ingredientes que tem tudo a ver com a mítica e magia do cinema.

Mas acho que ele escorregou em A origem, que não entendi patavina de nada. Me senti um otário, como nas sessões de Matrix. Mas eu acho que o problema sou eu, que não tenho inteligência suficiente para entender a engenhoca onírica que ele criou em seu filme. Prefiro mais coisas “pé no chão”, como Woody Allen ou Billy Wilder.

Toy story 3 concorrendo ao Oscar de melhor filme até parece uma piada, mas entendo a coragem dos produtores norte-americanos que visam, com essa ousadia, valorizar um mercado que vem crescendo ano após ano: o da animação. E o que é melhor, com as melhores histórias nas telonas. Vi Toy story 3 com a minha afilhada. Ela gostou, então eu gostei também.

Estrelado pela gatinha Natalie Portman, Cisne negro foi uma grande surpresa, até porque o nova-iorquino Dan Aronofsky é um diretor estilo montanha-russa, cheio de altos e baixos. É capaz de ridicularizar sua arte com pretensões como Fonte da vida, mas surpreender em trabalhos de peso como O lutador, que tem em O vencedor, o concorrente equivalente este ano. Seu Cisne negro é um exercício denso, intrigante e versátil do ponto de vista de roteiro sobre o bem e o mal, as duas facetas que dominam nossa personalidade. Acho que Natalie tem tudo para levar a estatueta de melhor atriz. Mas se perder, não será uma tragédia.

O charmoso britânico Colin Firth é a minha aposta na categoria melhor ator, com todo respeito a Jeff Bridges

Agora a briga feia mesmo será entre os pesos-pesados Bravura indômita e O discurso do rei, duas obra que sintetizam em todos os seus atributos, o que é a arte do cinema. Bravura indômita, dos irmãos Ethan e Joel Cohen, tem o mérito por si só por apenas fazer uma grande homenagem à sétima arte e um dos seus ícones, John Wayne, sem macular a obra original de 1969. Por tabela, eles reverenciam o western, gênero cinematográfico norte-americano por excelência.

Tenho medo de remakers, imaginam se inventam reproduzir um clássico como Casablanca nos dias de hoje? Seria uma droga, como fizeram com o singelo Sabrina, de Billy Wilder. Mas em se tratando dos irmãos Cohen tudo é permitido e acho que eles mandaram bem. Gosto da atuação magistral de Jeff Bridges, como o canastrão xerife J. “Rooster” Cogburn, mas acho o charmoso Colin Firth mais ator em O discurso do rei, o meu filme predileto no páreo. Aliás, essa produção inglesa dirigida por um ilustre desconhecido, Tom Hooper, é o grande projeto do ano.

O filme parte do menos para chegar ao mais. Tendo como escopo o tema batido da amizade, cria uma história cheia de situações intimistas que valorizam, em sua plenitude, as atuações marcantes de Colin Firth e Geoffrey Rush, a dupla sensação deste ano. Ficaria feliz e menos ludibriado se O discurso do rei saísse com os principais Oscars debaixo do braço.

Mas acho que na hora da transmissão vou ver mesmo é um filme do Billy Wilder, talvez Crepúsculo dos deuses, em homenagem às falcatruas e malandragens dessa cerimônia que se tornou uma feira lobista. Ou vocês acham que O que isso companheiros?, Central do Brasil e Cidade de Deus chegaram à festa como concorrentes só por suas qualidades?

* Esse texto foi escrito ao som de: Achtung baby (U2 -1991)

O profeta tricolor baila no céu

"Meu sentimento clubístico é anterior ao sexo, anterior à memória", Nelson Rodrigues, o mais célebre dos torcedores do Fluminense

No dia 02 de dezembro de 1980 o dramaturgo e cronista Nelson Rodrigues estava à beira da morte. Aos 68 anos, com a saúde fragilizada e a consciência dominada por kilos de medicamentos, nem percebia direito o que se passava a um palmo do seu nariz. O que dizer das coisas que rolavam no mundo lá fora. Mas aquela final inesquecível entre o tricolor carioca e o Vasco não passaria despercebida ao olhos, ouvidos, sentidos do mais empedernido, fanático e lancinante dos torcedores do clube: ele. “O Fluminense nasceu com a vocação da eternidade. Tudo pode passar. Só o tricolor não passará, jamais”, escreveu certa vez o apaixonado torcedor. “Meu sentimento clubístico é anterior ao sexo, anterior à memória”, defendeu, noutro momento.

Assim, munido de um radinho de pilha – uma das severas exigências do amigo da família e médico Stans Murad, que o proibiu, terminantemente, de ver o clássico pela televião-, e acompanhado de um dos filhos (que tinha o mesmo nome do pai), partiu para sua última batalha. A vitória seria inesquecível. “Foi uma doce e santa vitória. Tudo começou há seis mil anos atrás. (…) Amigos, os idiotas da objetividade custaram a perceber a evidência ululante”, registrou na última crônica, ditada ao filho. O episódio está registrado no livro O profeta tricolor, edição da Companhia das Letras que reúne as melhores crônicas do Velho, como seus filhos gostavam de chamá-lo, sobre o Fluminense.

Por essas e outras que tenho plena certeza que o grande cronista esportivo Nelson Rodrigues deve estar neste momento dando cambalhotas de acrobata circense numa daquelas nuvens do céu. Afinal, seu clube do coração mais uma vez é campeão, depois de 26 anos de jejum. São Pedro, com suas sandálias, Ben-Hur, o remador, Sobrenatural de Almeida – um de seus personagens clássicos -, Cleópatra, a Rainha do Nilo, Cristo e o jornalista Armando Nogueira, companheiro inseparável de jogos no Maracanã, possivelmente estão contemplando essa euforia tricolor.

Confesso, já fui bastante ligado ao futebol, cheguei a sonhar em me tornar um grande jogador, mas os Beatles entraram em minha vida e tudo mudou. Não vi a final toda entre o Fluminense e Guarani neste domingo (05). Preferi ver minha afilhada se divertir no parque de diversões. Mas me emocionei com o título do clube de um dos meus grandes ídolos. Logo eu, um torcedor do Atlético Mineiro molambento.

Salve o tricolor!

Ben-Hur pela ducentézima vez

Passei à noite em claro vendo pela ducentézima vez o épico Ben-Hur. Fui dormi às 05h da madruga!!! Mas valeu à pena. Que filmaço. Não canso de ver. Não canso de admirar, a cada sessão novas descobertas, detalhes outrora despercebidos vem à tona. Charlton Heston era tão bonito, né? Breve resenha crítica sobre o maior filme bíblico de todos os tempos…

Dez filmes inesquecíveis!

Lembra de Alta fidelidade? Aquele filme baseado no best seller inglês escrito pelo Nick Hornby e cujo personagem Rob (John Cusack) tinha mania de conversar relacionado  lista de cinco melhores coisas sobre tudo? Então, todo mundo tem sua lista de top 5, top 10 sobre dezenas de coisas. E o legal é que, como cada cabeça é um universo, cada coração é um mundo, cada alma uma catedral, as diferenças imperam norteadas por sensações, impressões, afetividades, experiências pessoais. 

Adoro filmes, vejo basicamente um por dia e às vezes a mesma fita várias vezes. E, por uma estranha razão, os melhores filmes que assisti são antigos, clássicos. Quase sempre histórias pequenas, intimistas. Tenho preguiça dessas produções barulhentas na qual o protagonista está sempre salvando o mundo de alguma coisa. Sou meio parado no tempo, meio anacrônico mesmo e daí?! Motivado por uma amiga, listo os dez filmes da minha vida… 

Cidadão Kane (Orson Welles – 1941) – O teatro moderno brasileiro se divide antes e depois de Vestido de Noiva, do Nelson Rodrigues. O divisor de águas do cinema moderno norte-americano é Cidadão Kane, do Orson Welles, o menino prodígio de Hollywood que acabaria amaldiçoado pela sua própria genialidade. Antes desse revolucionário filme, os enredos em Hollywood eram norteados sempre por narrativa linear, com começo, meio e fim. Aqui Welles, que na época tinha apenas 25 anos (um bebê), introduziu o flashback, tramas intercaladas com subtramas, imagens distorcidas e câmeras com ângulos ousados, além de recursos técnicos inovadores que mudaram o jeito de se fazer cinema. A história também era dinamite pura, baseada na trajetória de famoso e corrupto jornalista da época. Rogério Sganzerla o idolatrava, Glauber Rocha também. 

 

Nessa divertida e mordaz crítica social Chaplin deixa-se engolir pelas engrenagens do capitalismo

Tempos modernos (Charles Chaplin – 1936) – Chaplin é daquele tipo de artista completo, cuja obra apresenta unidade singular. Ele produziu, dirigiu e protagonizou vários projetos seus. O meu preferido é Tempos Modernos. Mestre da pantomima, do humor gestual, ele cria diversas situações engraçadas, difíceis de apagar da memória. Antológica, por exemplo, a cena em que ele se enrola literalmente nas engrenagens de uma máquina, elucidando, quase que ingenuamente o esmagamento do homem pela máquina. Guardo duas cenas marcantes dessa comédia social: a passagem em que ele é confundido como o líder de uma greve ao tentar devolver uma bandeira derrubada de um caminhão (e que Woody Allen reproduziu, bem à sua maneira, em Bananas) e o final lírico, cheio de esperança, bem Charles Chaplin.

Casablanca (Michael Curtiz – 1942) – Para mim é a melhor história de amor já escrita para o cinema, melhor roteiro original sobre o tema. Mas a trama tem de tudo, suspense, ação, thriller de guerra, comédia e um final surpreendente, de tirar o fôlego… E a Ingrid Bergman está soberba, linda! A primeira vez que ela aparece em cena é deslumbrante. A película é em preto e branco, mas os olhos dela brilham. Sem falar no Rick, o herói vivido por Humphrey Bogart, um monólito por fora, mas uma manteiga derretida por dentro. Gosto do personagem porque, assim como ele, eu nunca fico com a mocinha no final… 

No clássico Casablanca os olhos de Ingrid Bergman brilham

Cantando na Chuva (Gene Kelly/Stanely Donen – 1952) – Adoro musicais. O engraçado é que quando meu irmão descobriu isso achou que eu fosse “mochinha”… Puro preconceito! Acho muito engenhoso a forma como o cinema americano unia numa mesma paleta, numa mesmo enredo, dança, música e teatro. Cantando na chuva é a síntese desses elementos, protagonizado por um dos artistas mais completos do gênero: Gene Kelly. Fred Astaire poderia ser a autoridade no assunto, mas Kelly era o melhor. Pelo menos eu acho. Além do inteligente exercício de metalinguagem, a trama contava com uma trilha sonora marcante, um sundae: “Good morning, good morning…”. 

A morte chacoalha seus ossos no drama existencial dirigido pelo mestre da alma Ingmar Bergman

O sétimo selo (Ingmar Bergman – 1956) –  O Ingmar Bergman era o cineasta da alma, bem existencial, denso e frio… Talvez porque ele fosse da Suécia… Começou a carreira no teatro, daí o fato de ter uma habilidade quase cruel na construção dos personagens, a maioria criaturas angustiadas, tristonhas. Aqui ele cria uma fábula perturbadora sobre a vida e a morte na história de um cavaleiro medieval que se vê perseguido pela personificação da mesma. O fato de a trama ser ambientada no século 12,13, acho, era mera metáfora para o diretor falar das aflições do seu tempo… A primeira vez que vi o filme, na faculdade, senti um medo mítico da morte, que chacoalhava seus ossos em meus sonhos (pesadelo?!). Mais tarde percebi que era um medo existencial, metafísico… 

 
Ben-Hur (William Wyler – 1959) – Desde pequeno adoro os épicos bíblicos. Quo Vadis (1951), Os dez mandamentos (1956), Sansão e Dalila (1949), Barrabás (1961), todos grandes filmes e com atuações magníficas. Mas quem não se emocionou com as aventuras de Judah Ben-Hur, filho de hebreus condenado à escravidão por se recusar a entregar seus irmãos. Roteiro poderoso, repleto de tensões dramáticas e com sequências inesquecíveis como a corrida de bigas. Numa época em que o máximo que se tinha de efeitos especiais era sangue a base de sopa de tomate. Difícil, por exemplo, pensar em outro protagonista senão Charlton Heston. E pensar que Burt Lancaster recusou o papel por ser ateu e Paul Newman por não querer usar aqueles charmosos saiotes. Sorte nossa…

 

Se meu apartamento falasse (Billy Wilder – 1960) – Poucos cineastas burilavam seus roteiros com esmero como Billy Wilder, um mestre em mostrar as fraquezas da alma humana. Para o velho Billy, o ser humano era um mau-caráter por natureza. Aqui, Jack Lemmon (o eterno loser) vive funcionário de uma grande empresa que ganha a confiança dos chefes alugando seu apartamento para encontros amorosos. A coisa se complica quando ele descobre que uma dessas “pombinhas” é a pessoa que ele ama (Shirley MacLaine). Decepcionado, resolve acabar com a farra pedindo a “chave” de volta. O desfecho é exemplar e o filme tem uma das declarações de amor mais sacadas que já ouvi. É quando o personagem de Lemmom convida sua paixão (ela não sabe que ele gosta dela) para jantar no apartamento e comenta: “Era como se eu fosse Robinson Crusoé em Nova York, um náufrago entre oito milhões de pessoas. Um dia, vi uma pegada na areia e era você. Puxa, como é bom jantar a dois!”. Mais singelo impossível, ainda mais em se tratando de Billy Wilder. 

A noite (Michelangelo Antonioni – 1961) – Uma vez eu entrevistei o Paulo José para uma mostra retrospectiva sobre sua carreira e ele, um eterno homem da sétima arte, lamentava o fato do “cinema não ter mais o tempo do cinema”. E é verdade. O cinema não tem mais o tempo que o cinema deveria ter. Mas os filmes do Antonioni cristalizaram essa verdade. E o cara só dirigiu obra-prima. O que mais gosto é deste. O segundo de uma trilogia sobre ciúmes, relações conjugais à deriva. (Os outros são: A aventura e O eclipse). Na história, Marcello Mastroianni encarna um intelectual vaidoso sujeito a se corromper tanto pelo lado material, quanto afetivamente.

Antonioni exorciza os demônios de conturbada relação amorosa por meio do triângulo formado por Jeanne Moreau, Mastroianni e Monica Vitti

Sentimentos colocados à prova na difícil relação com a frágil mulher (Jeanne Moreau) e um rápido flerte (Monica Vitti), consumado numa elegante festa. A narrativa do filme se resolve em 24h. O final é de um lirismo arrebatador, com o casal indo embora por entre um gramado, na aurora, depois de expurgar todos os fantasmas do casamento na noite passada. O que mais gosto dos filmes do Antonioni são suas musas, todas de uma elegância renascentista tocante!

Terra em Transe (Glauber Rocha – 1967) – Glauber Rocha era maluco, convulsivo, mas genial, como todo artista da sua estirpe tinha que ser. Dono de estilo arrebatador foi capaz de realizar filmes herméticos, chatos, possíveis de serem registrados uma única vez pelas nossas retinas. Acho que nunca mais vou ter coragem de ver A idade da Terra (1980). Mas Terra em transe é um marco do cinema político brasileiro. Assim como Deus e o diabo na Terra do Sol (1964), foi responsável por criar uma catarse reflexiva a cerca dos problemas sociais daqueles negros tempos. Delirante e tristemente atual a alegoria de uma terra imaginária na qual governantes corruptos e populistas são capazes das maiores baixezas para chegar as maiores alturas. José Lewgoy está um primor na pele do político demagogo, assim como o jornalista Paulo Martins (Jardel Filho) figura minha lista dos grandes heróis do cinema. 

Manhattan (Woody Allen – 1979) – Woody Allen é do tipo de artista que você ama ou odeia. Eu amo Woody Allen! Para mim é o mais autêntico, original e sincero dos cineastas. Tal qual Fellini, Godard, criou seu próprio universo particular nas telas, dando vazão, por meio de histórias singelas, em grande parte engraçadas, sempre retocadas por lírica melancolia. Espécie de relicário afetivo, Manhattan é uma declaração de amor ao cinema, à cidade que ele ajudou a mitificar, aos seus sonhos e desejos mais recônditos. Lindas as relações afetivas construídas por Allen tendo como pano de fundo um dos cartões postais mais famosos… 

Em Manhattan Woody Allen presta uma homenagem singela à cidade que imortalizou sua obra