Gente como a gente (1980)

Os Jarrett, uma família destroçada por momentos tristes e trágicas

Os Jarrett, uma família destroçada por momentos tristes e trágicas

Três títulos ali do final dos anos 70 e começo dos anos 80 que sempre eram exibidos nos especiais de fim de ano, durante um bom tempo, povoaram meu inconsciente de guri curioso. Não sei se pelos personagens que eu via de relance nas propagandas, pelos nomes que estrelavam a fita ou alguma coisa do tipo. Tootsie (1982), aquele filme em que o Dustin Hoffman se veste de mulher, era um deles. Kramer vs. Kramer (1979), também protagonizado por Dustin era outro. Mas esses eu vi, conhecia a história, matei a vontade de ver e tudo o mais. Gente como a gente (1980), a estreia de Robert Redford na direção, o terceiro filme desse triângulo eu não conhecia. Vi outro dia no Telecine Cult e achei formidável.

A história, de uma simplicidade incrível, gira em torno de uma família classe média alta norte-americana destroçada por momentos tristes e recordações trágicas que envolvem morte e tentativas de suicídio. Após perder o irmão mais velho num acidente, o jovem Conrad (Timothy Hutton) é atormentado pelo sentimento de culpa. O peso em seu coração é tão grande que um dia tenta suicídio cortando os pulsos.

O comportamento estranho de Conny preocupa o pai afetuoso (Donald Sutherland), mas nem Gente como a gentearranha a sensibilidade da fria, imprevisível e egoísta mãe (Mary Tyler Moore), que o culpa por tudo o que aconteceu. “Ele nos desrespeita e você pede desculpa”, condena, ríspida, o marido. “Tudo o que temos em comum com as mães é superficial”, se defende o filho, amargurado pela perda, pela dor, pela rejeição.

À medida que a situação se avança, a complexa convivência do que restou dessa família só piora e tudo indica que é um caminho sem volta. Daí a figura importante de Dr. Berger (Judd Hirsch), um psiquiatra que não inspira muita confiança, mas é eficiente no tratamento com seu paciente. O desfecho sem happy end é exemplar e pouco usual em produções hollywoodiana.

Embora a pieguice em alguns momentos dê o ar da graça, Gente como a gente – cujo título original (Ordinary people) é um sundae -, impressiona pelo realismo desse conflito familiar. A cena em que o marido, recordando o dia do enterro do filho, questiona a futilidade e egoísmo da esposa e implacável. Protagonizando seu primeiro filme, a linda Elizabeth McGovern é um deleite aos olhos com sua beleza à la Ana Paula Arósio.

Disputando as principais categorias do Oscar com Touro Indomável, o filme de estreia de Robert Redford abiscoitou quatro estatuetas: Melhor Filme, Diretor, Ator Coadjuvante (Timothy Hutton) e roteiro para Alvin Sargent.

Conhecido pelo porte de galã, Redford, que sempre foi um ator no mínimo profissional, se mostrou aqui, nesse debute, ser um ótimo diretor, daqueles que sabe dosar com elegância climas densos numa trama. Melhor ainda como diretor de atores. Beleza não põe à mesa.

* Este texto foi escrito ao som de: V (Legião Urbana – 1991)

V