Diretores – Pier Paolo Pasolini

Pasolini e Anna Magnani nos bastidores de Mama Roma

Pier Paolo Pasolini e Anna Magnani nos bastidores de Mama Roma, filme de 1962

Pasolini era um pervertido do cinema. E isso não tinha nada a ver com sua condição de homossexual assumido. Não mesmo. Antes de tudo, esse artista italiano controverso e polêmico era um intelectual moralista que confrontava, impiedosamente, a sociedade hipócrita de seu tempo, na mesma medida em que lançava um olhar crítico sobre a estrutura política de seu país, assim como no Brasil, uma das mais atrasadas do mundo. Culto, antes de se enveredar pelos caminhos do cinema fora poeta e escritor, professor acadêmico, além de flertar com o partido comunista.

Pertencente a turba de artistas que, no final dos anos 50 e início dos anos 60 brindou os amantes da sétima arte com o neo-realismo italiano, assim como seus colegas, Fellini, Visconti, Antonioni, Pasolini radicalizou o gênero com um estilo próprio em que prevalecia o canto poético, o discurso político, o conflito entre a herança mística e a tendência socialista de seus roteiros. Solidificou assim as bases do cinema de poesia que pegou de surpresa, por exemplo, o baiano Glauber Rocha, que mergulhou as obras de sua segunda e mais hermética fase, em poesias visuais.

Eu nem sabia que existia o Liberty Mall, quando fui lá para assistir, nos meus tempos de faculdade, Saló, ou os 120 dias de Sodoma. Mesmo com as pré-leituras sobre o último filme de Pasolini, lembro que saí da sessão com um sentimento de asco. O tempo me deu régua e compasso para compreender que, dentro daquela narrativa escatológica, o diretor estava mais do que coberto de razão. Era sua visão decadente e suja da política italiana, num espelho deprimente da política universal.

salóTop Five – Pier Paolo Pasolini

Saló, ou os 120 dias de Sodoma (1975) – Me introduzir no universo pasoliniano pelo seu último trabalho e foi uma experiência traumatizante. Saí da sessão, horrorizado, mas a experiência e maturidade me deram subsídios para entender a poderosa e bizarra metáfora do diretor para a política dos dias atuais, pegando como prisma o fascismo de Mussolini. O diretor morreria brutalmente assassinado, meses antes de terminar a fita.

Accatone – Desajuste social (1961) – Estreia do intelectual Pasolini atrás das câmeras, o filme apresenta herança do cinema neo-realista, corrente que marcaria a sua geração de cineastas. Trabalhando com atores amadores, uma de suas características, trás à baila aqui a simplicidade do cotidiano com suas ruas cheias de verdade, onde homens comuns transitam pelos bairros populares da vida.

Teorema (1968) – O mais polêmico e pervertido dos projetos do diretor, a fita é uma afronta à instituição família, aonde um misterioso sujeito vindo de lugar nenhum, muda para sempre a vida de todos, corrompendo a moral de todos na casa de um rico industrial.

Mamma Roma (1962) – Ainda bebendo no neo-realismo, o cineasta chocou os puritanos com a história da prostitua Mamma Roma, Anna Magnani em atuação soberba. Ela cansou de doar seu corpo e alma aos asquerosos homens que a procuram e agora quer mudar de vida e classe social, mas o preconceito e falso moralistas que o cercam irão minar o seu sonho.

Medéia (1969) – Apaixonado por histórias clássicas, Pasolini revisita o mito de Medéia tendo no papel-título a diva da ópera, Maria Callas. Quando vi a fita pela primeira vez odiei, por conta da narrativa não linear e espasmo poéticos do diretor. Hoje o filme desce fácil.

* Este texto foi escrito ao som de: El toro (Suíte Super Luxo – 2004)

El toro